12 de mai. de 2010

Salve Vô Benedito


13/05/2010 - 01h23
Era dia 12 de maio, fazia muito frio e eu me recuperava de um danado resfriado. Estava me ajeitando pra deitar, tomei um chá de erva cidreira bem quente, do jeito que minha mãezinha me ensinou. Esquentei uma caneca d’água , coloquei umas gotas do óleo de cânfora e inalei aquele vapor bem quente. Tudo como manda a tradição lá de casa.

Apaguei a luz, custei a dormir, estava com uma porção de coisas na cabeça, queria conversar, mas não sabia bem o que e com quem. Os pensamentos iam e vinham descompaçadamente, até que eu dormi. Então eu me peguei a sonhar.

No sonho, descobri que eu tinha um avô pretinho, da cor de um taio de café forte. Chamava-se Benedito, tinha pra lá de 100 anos, carregava um pequeno pedaço de pau, que fazia de bengala e um cachimbo com fumo, alecrim e erva doce. Andava todo curvo, se apoiando na sua bengala. Estava descalço com uma calça de pano de saco, arregaçada até as canelas e uma camisa de manga.

Vô Benedito veio em minha direção e pegou a falar. Tinha um dialeto diferente, algumas coisas eu custei a entender. Curiosamente os pensamentos descompaçados, começavam a fazer algum sentido com o que eu ouvia de Vô Benedito. Ele se sentou na beira da cama, disse que estava ali porque queria entender porque aqui na terra nós brigamos tanto para ser livres e quando alcançamos a liberdade nós mesmos nos aprisionamos em nossas próprias prisões. Falou que em seu tempo, aqui na terra, o homem negro vivia aprisionado nas senzalas e no cárcere eles viviam suas culturas, suas crenças e seus amores livremente. Explicou que tinham o espírito livre, como um pássaro, embora fossem escravos, não perderam na escravidão suas identidades, foram resistentes e criativos para preservá-las. Disse que hoje acreditamos que somos livres mas na verdade vivemos a ditadura do consumo, da ganância, do ter e assim acabamos nos perdendo, sem espírito, sem alma, sem identidade.

Perguntei ao Vô Benedito porque ele estava me falando tudo aquilo. Eu estava um pouco confuso, não sabia mais se aquilo era de fato um sonho, parecia tudo tão real. Ele me respondeu que na verdade já tinha me dito tudo aquilo, mas eu não tinha entendido, por isso os pensamentos descompaçados. Falou que já está comigo a algum tempo, que vem ao meu encontro prosear todas as noites, em meus sonhos, mas eu nunca o tinha dado ouvidos e que agora chegou a hora de eu me despertar e ouvir meu espírito.

Acordei dia 13 de maio lá pelas 10 horas, a conversa foi longa, me ajudou entender que precisamos ouvir o espírito para sermos livres e que a maior riqueza da vida está no amor. E ele é humilde e caridoso, como o Vô Benedito. Curiosamente o cheiro de pito exalava pelo quarto e a porta da casa estava aberta. O que foi isso, um sonho? Ou será que tenho um vôzinho? Um negro-velho?
Paulo Roberto dos Santos - Paulinho

6 de mai. de 2010

Debate: Diretrizes políticas para atendimento de crianças e adolescentes em situação de rua



05/05/2010 – 14h00 às 17h30


Debatedores:
Dr. Marcelo Prinsceswal (RJ)
Mestre em Políticas Públicas, Graduado em Psicologia (UERJ), Pesquisador do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI)

Sra. Aparecida Rodrigues dos Santos
Graduou-se em Serviço Social, é Especialista em Gestão Pública e Técnica do Ministério do Desenvolvimento Social – MDS


O debate foi mediado por uma Juiza da Infância de Santa Catarina, membro da ABMP, infelizmente eu não consegui tomar nota seu nome. Iniciando os trabalhos, Dr. Marcelo apresentou o Projeto de Pesquisa que está desenvolvendo no CIESPI, denominado: “Os processos de construção e implementação de políticas públicas para a criança e o adolescente em situação de rua”. A pesquisa foi desenvolvida entre a segunda metade de 2007 e a primeira de 2008 e tem como objetivo entender os processos de construção e implementação de políticas públicas para crianças e adolescentes em situação de rua.

Segundo Marcelo, para entender estes processos é fundamental entendermos o fenômeno da estruturação de crianças e adolescentes na rua e a definição que se faz , nos governos, por criança, adolescente e situação de rua.

Ele explica que o fenômeno da vivência na rua se explica não só por um fator, isolado, como se pensa. Disse que geralmente relacionam a saída da criança/adolescente de sua casa para ficar na rua com uma vivência de trabalho infantil, anterior à estruturação na rua, mas mostra, inclusive com dados estatísticos que este fenômeno se dá também por outros fatores, embora este seja um dos fatores mais recorrentes nesta população.

Marcelo conta que a pesquisa mostrou que este fator muda de cidade para cidade, nas diversas realidades do país. Que enquanto em uma cidade a maioria de crianças e adolescentes estruturados na rua declaram estar na rua por conta da violência doméstica que sofria, noutra a maioria se dá pela exploração do trabalho infantil.

Neste sentido, Marcelo sustenta que são muitos os fatores que levam uma criança/adolescente a se estruturar na rua. Ele conta que na pesquisa fizeram um levantamento, procurando relacionar estes fatores com outros indicadores sociais sobre as condições de vida destas crianças/adolescentes. Não consegui anotar todos os dados que ele passou, anotei apenas alguns indicadores, sendo eles: condições de saneamento básico inadequado; taxa de analfabetismo funcional; taxa (in)adequação entre a idade e a série da criança/adolescente na escola; crianças/adolescentes oriundas de famílias com renda per capta abaixo da linha da pobreza (Ipea: R$ 201,27 por mês ou 6,70 por dia); família sem acesso à seguridade social (o tripé: assistência, previdência e saúde); situação de vulnerabilidade social. Também acrescentou que, segundo a pesquisa as crianças vão para a rua com idade entre o 7º e 11º ano de vida.

Com pouco tempo para falar, Marcelo também fez alguns apontamentos interessantes. Falou do equivoco que se pensa ao falar do vinculo familiar de crianças e adolescentes em situação de rua. Disse que mais de 90% dos entrevistados, fazem referência à família, na sua maioria personificada na figura da mãe. Por outro lado, cerca de 81% afirmam que o pai não são de sua família. Portanto, para Marcelo não é verdade que a criança e adolescente que está na rua perdeu os vínculos familiares. Ele também falou do grande problema que nota em todo o país, quando se fala em crianças/adolescentes em situação de rua: o crack. Denuncia que as Secretárias de Saúde não estão assumindo sua responsabilidade e deixando crianças e adolescentes morrerem sem o devido tratamento.

Já nas considerações finais Marcelo falou dos resultados obtidos nas entrevistas com as crianças/adolescentes e com seus educadores sociais de rua. Verificaram algumas características nos grupos de crianças/adolescentes em situação de rua: fixam grupos pequenos, de no máximo 20, mas geralmente de 3 a 7 pessoas. Que fixam grupos por amizade, por questão segurança e sociabilidade. Apontaram, na pesquisa como desejo/projeto para suas vidas: ser respeitado; ter uma casa própria; arrumar um trabalho; ter lazer; constituir família. Marcelo disse que só conseguiremos desenvolver e implementar políticas públicas para esta população quando a entendermos bem. Disse que a criança/adolescente em situação de rua não chegou a rua do dia para noite e por isso, sua volta para casa deve respeitar um processo de educação (não formal) gradual e processual. Que não adianta querermos institucionalizar estas crianças ou mesmo levá-las de volta para a família, sem o seu consentimento, a sua vontade, elas logo na primeira oportunidade voltaram para a rua. Por fim falou que a implementação de políticas públicas nesta área, deve ser pactuada com todos os envolvidos, com a sociedade civil organizada, com o Estado, os conselho, etc. Disse que ações de truculentas, já experimentadas em vários lugares do país, não resolvem o problema. Não passam de higienização social.

Foi o que pude anotar, são só relatos, achei muito boa a exposição do Marcelo. Noutra oportunidade, tentarei desenvolver algumas linhas sobre esse assunto, procurando explicitar vivências minhas no Conselho. Aguardem!

A segunda debatedora, francamente, também teve um fala boa, mas não consegui anotar. Depois comento o que eu lembrar.

Logo, logo volto escrever mais.

Abraço

Paulinho
06/05/10 – 02h05

5 de mai. de 2010

XXIII Congresso da ABMP


Caros Amigos,

Conforme tinha prometido, estou tentando partilhar com vocês, neste blog, um pouco do que tenho vivido no Conselho Tutelar. Não me faltam assuntos para escrever, mas careço de um pouco mais de tempo para registrar tantas experiências e aprendizagens. No Conselho vivenciamos situações intensas, algumas bizarras e outras tantas trágicas. Mas também estou passando por um processo de formação muito rico, tanto pela experiência prática de enfrentar estas situações, quanto pelas discussões, pelos cursos e capacitação que passamos. Além disso, o fato de estarmos no Conselho, dia-a-dia dialogando com outros profissionais da rede de atendimento, com os próprios colegas de trabalho, faz deste serviço uma ceara de conhecimentos na área de infância e juventude.
Neste sentido, aqui estou eu escrevendo para socializar as discussões que estou participando, aqui em Brasilia/DF, no XXIII Congresso da Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça, Defensores Públicos da Infância e da Juventude - ABMP.
O XXIII Congresso da ABMP iniciou hoje, dia 5 de maio e termina sexta-feira, dia 7. O evento acontece concomitante ao I Encontro Regional da Associação Mercosul de Magistrados da Infância e da Juventude. Contamos com a presença de juizes, promotores públicos, defensores públicos, conselheiros tutelares, gestores públicos, conselheiros de direitos e pesquisadores da área de infância e juventude.
A delegação aqui presente vem de todos os Estados da Federação, da Argentina, Paraguai, Uruguai, entre outros países da América Latina.
Depois de uma longa mesa de abertura, com muitas saudações, agradecimentos, congratulações, bla, bla, bla, ... no período da manhã, à tarde fomos para as salas do Centro de Convenções, onde acontecia as mesas temáticas. Estamos aqui em quatro conselheiros tutelares de Campinas, um(a) de cada região. Organizamos-nos de maneira que cada um acompanhasse uma sala de discussão. Fiquei numa onde discutiam diretrizes políticas para atendimento de crianças e adolescentes em situação de rua. O debate foi desenvolvido por Dr. Marcelo Prinsceswal (UERJ) e Sra. Aparecida Rodrigues dos Santos, especialista em gestão pública e técnica do Ministério do Desenvolvimento Social – MDS.
Adiante, escreverei minhas observações sobre este e os demais debates que irei participar.
Força pra todos(as) e dêem me forças para cumprir como o que me propus.
Abraço

Paulinho
05/05/10 – 22h51